Britto e Suplicy: Lei de Anistia não beneficiou os torturadores
Fortaleza, 23/08/2009 - Os 30 anos da Anistia Política trouxeram de volta o questionamento a um dos seus itens: enquanto deixou de fora, na época, presos políticos que haviam participado do confronto armado mais direto com o regime, os torturadores, que nem sequer haviam sido processados, foram considerados anistiados previamente por uma interpretação da lei que seria errônea. Agora, a OAB - apoiada pela Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) - entrou com recurso junto ao STF pedindo a declaração de invalidade dessa interpretação, alegando que ela fere tratados internacionais assinados pelo Brasil sobre direitos humanos, que não reconhecem a tortura como crime político.
Seguem opiniões favoráveis à ação movida pelo Conselho Federal da OAB e publicadas na edição de hoje (23) do jornal O Povo, do Ceará:
"A Lei de Anistia não acolhe os que praticaram crimes de tortura, que, nos termos da Constituição, são insusceptíveis de graça ou indulto e imprescritíveis. Esses crimes não se relacionam com o combate político que então se travou. Cabia aos agentes do Estado zelar pela guarda e integridade física daqueles prisioneiros. Não o fazendo, como não o fizeram, incidiram em delito penal. E a Lei de Anistia não faz menção a esses casos, que se excluem da luta política que se travou. A Lei abrange apenas os lados que combateram. Esse o teor da Ação por Descumprimento de Preceito Fundamental, que a OAB patrocina junto ao STF, tendo a seu lado os ministros da Justiça e dos Direitos Humanos, além de diversas outras organizações da sociedade civil brasileira".
CEZAR BRITTO
Presidente do Conselho Federal da OAB
"O Artigo V da Declaração Universal dos Direitos Humanos diz que "Ninguém será submetido à tortura, nem a tratamento ou castigo cruel, desumano ou degradante". Estou de acordo com os juristas Fabio Konder Comparato, Celso Antonio Bandeira de Mello e Dalmo de Abreu Dallari quando propõem ao Supremo Tribunal Federal que interprete a Lei da Anistia à luz dos preceitos fundamentais e, portanto, que a anistia não se estenda aos crimes comuns praticados pelos agentes da repressão contra os opositores políticos da ditadura militar. Quando os torturadores cometeram atrocidades, eles não representavam a sua instituição. É necessário que os casos sejam investigados e que a justiça especifique a responsabilidade individual de cada um".
EDUARDO SUPLICY
Senador/PT-SP
"Existe uma ação no STF para que ele se manifeste sobre o mérito da prescrição ou não do crime de tortura. O torturador não pode ser anistiado, ele precisa ser responsabilizado perante a lei e a sociedade pelo crime que ele cometeu. Isso vale para os nazistas que mataram e torturarame também para as torturas praticadas durante as ditaduras, no continente. Não se trata de revanchismo e sim de revelar os crimes contra os direitos humanos praticados durante o período de ditadura militar. A localização dos corpos dos desaparecidos políticos, que precisam ser acompanhados de esclarecimentos. Ex: o Ceará vai receber os restos mortais do guerrilheiro Bérgson Frota e seus familiares vão, finalmente, poder sepultá-los, mas precisam saber as circunstâncias de sua prisão e quem o torturou e assassinou".
PERLY CIPRIANO
Subsecretário da Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da
República
"A tortura praticada no Brasil por agentes do Estado à época da Ditadura Militar contra presos políticos e pessoas do povo, em face dos tratados internacionais que somos signatários, trata-se de um crime imprescritível. A interpretação de normas jurídicas deve ser norteada pelo respeito aos princípios constitucionais que pugnam pela dignidade humana, logo, não se pode dar entendimento a norma legal em benefício de quem se conduziu de forma a afrontar violentamente, através da prática abominável da tortura, os direitos fundamentais da pessoa humana. Todo e qualquer torturador, em qualquer época ou tempo, deve ser punido exemplarmente."
ARIMÁ ROCHA
Diretor Geral da Guarda Municipal e Defesa Civil de Fortaleza